MATÉRIA DE CAPA
Aterro Estaqueado no Brasil
Especialistas comentam aspectos relevantes da técnica e as principais obras do país
Solução consolidada no meio geotécnico, o aterro estaqueado é aplicado em obras específicas, em cenários nos quais as condicionantes são desfavoráveis e, ao mesmo tempo, os requisitos para a obra são mais rigorosos. Na prática, é aplicado em projetos de estruturas que devem ser construídas em um prazo limitado e que não podem admitir recalques perceptíveis quando implantados em terrenos de solo mole com espessuras significativas. “A utilização da técnica de aterro estaqueado com geogrelhas é muito bem aceita no Brasil, com um histórico de mais de 20 anos e um número significativo de projetos implantados no país”, destaca André Estêvão Silva, diretor-executivo da HUESKER Brasil.
A HUESKER tem uma experiência de mais de 30 anos de atuação em projetos de aterros estaqueados com geogrelhas. Ao longo desse período e pelo acompanhamento de centenas de projetos no Brasil e no exterior, a empresa agregou conhecimento sobre especificação de materiais, dimensionamento e projeto, desempenho da solução e cuidados construtivos. “Temos auxiliado diversos projetos compartilhados conosco em todos esses aspectos, que são sempre pontos-chave para o sucesso do empreendimento. Com base em nossa experiência, desenvolvemos critérios de projeto e de execução que são adotados por muitos projetistas e construtores em todo o mundo. Não vejo nenhuma outra empresa na indústria dos geossintéticos com o mesmo conhecimento acumulado e com a mesma capacidade de contribuição que a HUESKER neste tema”, ressalta.
A aplicação das geogrelhas em obras de aterro estaqueado permite reduzir o tamanho dos capitéis e melhorar o equilíbrio interno do aterro, além de reduzir o risco de “puncionamento” do aterro quando este é baixo. “Aterros estaqueados, tipicamente, exigem geogrelhas bidirecionais (mesma resistência em ambas as direções de trabalho) com resistências superiores a 100 kN/m. A HUESKER fornece as geogrelhas Fortrac bidirecionais em ambas as linhas, T e MT (respectivamente de poliéster e de PVA) para esta aplicação. Como a solução de aterro estaqueado, por conceito, exige geogrelhas de elevado módulo de rigidez à tração (baixa deformabilidade), nossa recomendação é, via de regra, a preferência pela linha Fortrac MT, de filamentos de PVA”, ressalta André.
Doutor em Engenharia de Solos, Werner Bilfinger, da Vecttor Projetos, destaca que o método é interessante, pois permite a construção de aterros em regiões de solos de alta deformabilidade e baixa resistência, sem que os aterros sofram recalques significativos. “Em relação a soluções estruturais, como viadutos ou lajes estaqueadas, utiliza-se muito menos concreto e aço, pois são necessários apenas os capitéis de concreto armado. Geralmente, aplicam-se estacas de capacidade de carga relativamente pequena, o que leva à necessidade de equipamentos de menor porte para execução das estacas. Ou seja, em um ambiente de ‘solos moles’, as atividades necessárias para a construção do aterro estaqueado geralmente não requerem a utilização de equipamentos de grande porte, preparação de fôrmas e armação (pois os capitéis muitas vezes são pré-moldados) ou outras atividades mais especializadas”.
O engenheiro ressalta uma particularidade das obras em aterros estaqueados. “Como em qualquer obra, o desafio é projetar e construir, ao mesmo tempo, uma obra econômica e segura. No caso dos aterros estaqueados, a otimização das dimensões do capitel, do espaçamento entre estacas e de seu tipo e capacidade de carga faz parte deste desafio. Depois de pronta, esse tipo de obra fica invisível, enterrada. A única coisa que se vê é um aterro, aparentemente comum”, diz.
Entre as inúmeras obras das quais participou, Werner destaca duas entre as mais significativas. “Uma foi a ligação Dutra- -Carvalho Pinto, no trecho em que se desenvolve ao longo do córrego do Vidoca, em São José dos Campos/SP. Nesta obra, foram empregadas diversas soluções com uso de geossintéticos, inclusive aterros estaqueados.
Outra obra desafiadora foi um aterro estaqueado realizado dentro de um terminal portuário. “Em portos, as sobrecargas são muito elevadas e, no caso desta obra, o aterro tinha pequena altura. No final, as estacas foram solidarizadas aos capitéis, solução não tão comum, para melhorar o desempenho e evitar eventual ‘tombamento’ dos capitéis devido a cargas concentradas elevadas”, relembra.
Werner Bilfinger elenca fatores relevantes que precisam ser considerados e que tem grande impacto na solução, alertando que é sempre importante que sejam avaliadas diversas soluções, considerando, entre outros fatores, custo, disponibilidade de materiais e prazo de execução.
• altura do aterro - aterros altos (maiores do que 5 metros) têm peso elevado e geralmente levam a fundações mais pesadas. Imagine um aterro com 8 metros de altura e com peso específico de 20 kN/m³ e uma sobrecarga aplicada na superfície de 20 kPa: se as estacas tiverem uma malha 2m x 2m, a capacidade de carga de trabalho de cada estaca terá que ser de 720 kN, que já é bastante elevada.
• espessura da camada de “solo mole” - se as espessuras forem pequenas, possivelmente pode ser economicamente interessante simplesmente remover o “solo mole” e levá-lo para um bota fora (se for economicamente e ambientalmente viável), ao invés de construir um aterro estaqueado. Já para espessuras muito grandes, o custo das muitas estacas necessárias para construir o aterro estaqueado pode começar a ser elevado, e a construção de um viaduto (apoiado em bem menos estacas) pode se demonstrar viável.
• deformabilidade da geogrelha - embora muitos métodos de cálculo não considerem este aspecto, é importante levá-lo em conta no projeto. Geogrelhas muito deformáveis podem levar a diversos problemas construtivos e de desempenho.
• aspectos construtivos - disponibilidade de materiais e equipamentos, acesso ao local, possibilidade de tráfego na superfície, necessidade ou não de construir um aterro provisório para permitir a construção. Um assunto que muitas vezes é negligenciado durante o projeto é o detalhamento das geogrelhas. Largura dos rolos, possível necessidade de emendas (de difícil execução e que podem não transmitir toda a carga), geometria curva do aterro, dentre outros aspectos que precisam ser considerados, pois podem impactar a obra e seu custo.
FERRONORTE: PRIMEIRA OBRA DA HUESKER NO BRASIL
Entre as obras de destaque que contam com soluções desenvolvidas pela HUESKER está a primeira obra atendida pela empresa quando se instalou no Brasil, em 1998: o aterro estaqueado da Ferronorte, no Mato Grosso do Sul. “Em um trecho de 450 metros da ferrovia referente à travessia de um rio, um aterro de até 9 metros de altura foi executado sobre microestacas e geogrelhas Fortrac 400/150 T, fabricadas sob encomenda e fornecidas pela HUESKER para esse projeto”, conta André Estêvão Silva.
O projeto ferroviário envolveu 500 km de Aparecida do Tabuado/MS até Alto Araguaia/MT, com a finalidade de escoamento da safra de soja para o porto de Santos/SP. “O principal desafio era referente aos prazos de cada etapa, pois o frete de soja ocorre por um período específico do ano e era comercializado antes do término das etapas. Com isso, tudo era um desafio em função dos prazos. Todas as obras de arte, abertura de frentes com desmatamento, projetos alternativos, interferências, troca de solo, drenagem, entre outras”, destaca o engenheiro civil Gilberto Garcia Gomes, que atuou na assessoria da diretoria da Constran S/A, executora da obra.
Para cumprir a execução de um grande aterro sobre solo mole com a necessidade de entrega da obra em um tempo recorde, o especialista ressalta que foram estudadas muitas soluções, com vários consultores geotécnicos para evitar a solução convencional que seria a sobrecarga com alguns meses de espera para o recalque necessário, resultando em manutenção por muitos anos, interrupção do tráfego comprometendo o transporte da safra e ainda a necessidade de grande volume de solo de empréstimo.
“Mediante a situação técnica e comercial, com multas de atraso de obra, a HUESKER, por meio de seus técnicos, apresentou a solução do aterro estaqueado com capitéis sobre a cabeça das estacas e uma geogrelha lançada no terreno para distribuição da carga. Foi a solução correta, independente de prazos e custos, pois após 20 anos a área continua intacta e segura”, ressalta Gomes.
Para este projeto, a HUESKER fabricou geogrelhas especiais de 400 por 150 kN/m de resistência nominal, respectivamente, nas direções longitudinal e transversal do rolo, o Fortrac 400/150 T. Para a época, uma geogrelha inédita. “O estaqueamento contemplava o uso de microestacas Alluvial Anker executadas pela Este Engenharia, em malha quadricular com espaçamento 1,35 metros entre estacas. O resultado de um espaçamento pequeno foi o elevado número de estacas”, conta o engenheiro civil Antonio Gonçalves Jr., na época diretor de produção da Este Engenharia.
A importância dessa obra para a engenharia e para a economia do Brasil é destacada por Gilberto. “Essa obra foi a pioneira no escoamento de toda safra do agronegócio do centro-oeste. Sem ela, hoje não teríamos o produto do agronegócio tão competitivo no mercado internacional, o que contribui significativamente para a economia do país. Esses foram os 500 km iniciais da vanguarda das ferrovias no Brasil”, afirma.
Execução da obra Ferronorte (1998)